quinta-feira, 16 de maio de 2013


Pacientes sob pressão

DÉCIO MION*
Raphael Falavigna
Nos últimos anos, milhões de pessoas em todo o mundo que se consideravam saudáveis foram, de uma hora para outra, advertidas de que tinham um problema médico. Isso aconteceu sem que elas apresentassem alteração alguma em seus parâmetros clínicos. Mudaram, sim, as diretrizes para o diagnóstico de várias doenças, como a hipertensão, o diabetes e o colesterol alto, entre outras. Foram estabelecidos também novos critérios que criaram um novo tipo de paciente, o pré-doente. O argumento a favor desse tipo de diagnóstico é que as pessoas que se encontram na faixa de risco para diversas enfermidades seriam alertadas para a importância das medidas de prevenção, sobretudo no que se refere à adoção de hábitos de vida mais saudáveis.
É importante lembrar, no entanto, que o diagnóstico de pré-doença sempre tem conseqüências emocionais, familiares e financeiras para os pacientes. No caso da classificação da pré-hipertensão, esse é um fator especialmente importante. Até 1994, segundo as Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, considerava-se a pressão normal quando ela era abaixo de 16 por 9. Em 1998, o índice de normalidade caiu para 14 por 9. Em 2002, além da pressão normal, foi criado o patamar de pressão ótima, aquela que fica abaixo de 12 por 8. Níveis tão baixos de pressão não são fáceis de alcançar. Geralmente é necessário recorrer a medicamentos, o que, por causa dos efeitos colaterais inerentes a qualquer remédio, torna o tratamento mais arriscado. Além disso, como os médicos não estão bem treinados para fazer ajustes finos na dose dos remédios, é pequeno o número de pacientes que, apesar da terapia medicamentosa, atingem a pressão-alvo.
É difícil entender por que as autoridades médicas americanas decidiram em 2003, sem nenhuma evidência científica nova, mudar os parâmetros de normalidade da pressão arterial e apavorar milhões de pessoas. Passaram a chamar os pacientes com pressão entre 12 por 8 e 14 por 9 de "pré-hipertensos" e aqueles com pressão abaixo de 12 por 8 de "normais". Como somente metade dos pré-hipertensos irá se tornar hipertensa no futuro, esse diagnóstico pode levar uma pessoa a passar desnecessariamente pelo stress de ser rotulada como doente. Muitos pacientes ligaram desesperados porque, num dia, tinham pressão normal e, no outro, passaram a ser pré-hipertensos. Alguns simplesmente desistiram das medidas preventivas: "Não aguento mais. Tenho me esforçado tanto e agora me dizem que nada valeu a pena, que sou doente", disse um deles. O Brasil e a Europa não adotaram as diretrizes americanas. A melhor forma de convencer as pessoas da importância de adotar hábitos de vida saudáveis não é pela ameaça, e sim pelo bem-estar que essas mudanças oferecem.                                                                    *Professor livre-docente, chefe da Unidade de Hipertensão do Hospital das Clínicas, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, e coordenador nacional da IV Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial
  
Postado por:Samanta Ávila Fonseca    
 5º semestre em Ciências Biológicas-Licenciatura   
Fonte:http://veja.abril.com.br



  

Nenhum comentário:

Postar um comentário